Em 2013/2014, o Gazélec Ajaccio foi o terceiro colocado da terceira divisão francesa, retornou à Ligue 2 e readquiriu o status de time profissional, perdido com o rebaixamento na L2 da temporada 2012/2013, quando foi o lanterna da competição. Com orçamento de aproximadamente 6,1 milhões de euros, o clube da Ilha da Córsega era novamente cotado à degola.

Mas a história em 2014/2015 foi diferente. O GFC fez grande campanha, foi vice-campeão da segundona - ficou atrás somente do campeão Troyes - e conquistou um inédito acesso à Ligue 1. A ascensão se torna ainda mais impressionante quando levamos em conta que o clube estava na quarta divisão em 2010/2011.

Até a recém-encerrada temporada, o grande momento do Gazélec a nível nacional fora a presença na semifinal da Coupe de France 2011/2012. Nessa edição, os corsos, que na época disputavam o terceiro escalão, eliminaram Toulouse, Troyes e Montpellier, equipes de divisões superiores, além dos amadores Gieres, Calvi e Drancy, e só pararam no Lyon, que viria a ser o campeão daquele ano.

Fundada em 1910 com o nome Jeunesse Sportive Ajaccienne, a agremiação teve vários nomes ao longo de sua história. Em 1933, mudou a nomeação para Football Club Ajaccio, até que, em 1960, fez fusão com o Gazélec Corse Club e formou o Gazélec Football Club Ajaccio. Em 1996, passou a se chamar Gazélec Football Club Olympique Ajaccio, mas voltou ao nome anterior em 2012, depois de retornar ao profissionalismo.

Os Diabos Vermelhos colecionam 17 participações na Ligue 2 e são a terceira força da Córsega. Com dois títulos da Ligue 2, um do Championnat National e uma taça da Coupe de France, além de um vice da Uefa Cup, dois vices da Coupe de la Ligue e 32 participações na elite, o SC Bastia é o escrete soberano da ilha. O posto de segunda força pertence ao AC Ajaccio, rival do GFC, com dois títulos da segundona e um troféu do terceiro escalão, além de 13 presenças na Ligue 1.

Mas o momento é do Gazélec, que venceu o último dérbi da cidade de Ajaccio por 3 a 0 e fará companhia ao SC Bastia na primeira divisão, enquanto o ACA, que por pouco não caiu à terceirona, será o único clube corso na próxima Ligue 2.

Campeão da quarta divisão em 2003 e 2011 e dono de outros quatro títulos amadores da década de 60, o GFC Ajaccio viveu um drama em 1999. Àquele ano, o modesto clube conquistou o acesso à L2 dentro de campo. Mas teve o acesso negado pela LFP porque o regulamento àquela época proibia uma cidade com menos de 100 mil habitantes de ter dois clubes profissionais na mesma divisão. Alvo de críticas, a lei foi derrubada mais tarde. E o GFC só conseguiu o retorno à segunda divisão 13 anos depois da polêmica decisão da liga.

Clube de origem operária, Gazélec tem "caldeirão" como arma

"Foram os nossos jogadores, liderados pelo técnico Pierre Cahuzac, que ergueram os alambrados, construíram e pintaram as arquibancas, plantaram e cuidaram do gramado. Este estádio é a nossa casa, a nossa obra. A obra de uma verdadeira família". As palavras são de Ange Casanova, presidente-fundador do atual Gazélec Ajaccio. Inaugurada em 1960, a praça esportiva se chamava Stade Mezzavia, em referência ao endereço do clube, até 1994, quando foi rebatizada com o nome do antigo mandatário.

O Stade Ange Casanova tem capacidade para 8 mil pessoas - 6 mil sentadas - e é considerado um "caldeirão" devido à sua acústica e à proximidade dos torcedores com o gramado. Além de sua casa ser um "inferno" para os adversários, o GFC tem outra vantagem: as longas viagens dos adversários à Córsega, ilha francesa localizada no Mar Mediterrâneo, a oeste da Itália. Entretanto, a presença do estádio na próxima Ligue 1 ainda é incerta. Caso o Ange Casanova não atenda aos requisitos da LFP, o time deve mandar seus jogos na casa do rival AC Ajaccio, o Stade François Coty.

O Gazélec Ajaccio está associado à classe ploletária da capital da Córsega. Sua massa de adeptos tem origem nos trabalhadores dos setores de eletricidade e gás. O nome Gazélec, inclusive, é uma referência à empresa EDF-GDF (Gaz = Gaz de France; élec = Électricité de France), local de atuação dos operários que formaram o clube.

Mesmo com o menor orçamento da Ligue 2, comandados de Thierry Laurey conquistaram acesso inédito à Ligue 1

Qual o segredo para um time com um orçamento muito baixo ter chegado tão longe? A resposta está na união do grupo. Os Gaziers não tiveram um jogador acima da média, que os carregasse nas costas. Quem recebe mais créditos pelo histórico acesso é o técnico Thierry Laurey, que renovou contrato com o clube por mais duas temporadas e terá a difícil - porém gratificante, acredita-se - missão de guiar o escrete em sua temporada de estreia na elite do futebol francês.

A carreira do ex-jogador de Montpellier (onde se consagrou), Valenciennes, Marseille, Sochaux, PSG e Saint-Étienne na área técnica é curta. Laurey acumula passagens por Sète, Amiens e Arles-Avignon. Está nos Diabos Vermelhos desde 2013.

A coletividade do plantel se comprova nos números. As estatísticas deixam os artilheiros e os "garçons" do time bem próximos uns dos outros. O goleador foi o meia Mohamed Larbi, com oito gols. O tunisiano foi seguido de perto pelos atacantes franceses Khalid Boutaïb e Kévin Mayi (seis gols cada) e pelo congolês John Tshibumbu, também atacante (cinco gols). O atacante francês Grégory Pujol, o meia Louis Poggi e o zagueiro David Ducourtioux vêm logo atrás, com quatro tentos cada um.

Ducourtioux e Pujol, inclusive, são os líderes de assistências, com quatro passes a gol. O meia Florian Fabre e o zagueiro Cyriaque Rivieyran têm os mesmos números.

Além de Larbi e Tshibumbu, outros quatro estrangeiros integram o elenco: o centro-africano Amos Youga, o senegalês Matar Fall, o comorense Ali M'Madi e o senegalês Jules Goda. Os dois primeiros são defensores, enquanto o terceiro é meia-atacante e o último é o goleiro reserva. O dono da meta é o francês Clément Maury.

Com 18 vitórias, 11 empates e nove derrotas, o Gazélec somou 65 pontos. Marcou 49 gols e sofreu 37, tendo sido dono do terceiro melhor ataque e da quinta melhor defesa da segundona. Além disso, passou 16 rodadas no G-3. Tamanha regularidade justifica o acesso, um sonho que se tornou realidade. A promoção se confirmou na 37ª rodada, a penúltima do certame, com uma vitória de 3 a 2 sobre o Niort no Ange Casanova.

Nas copas francesas, as campanhas foram modestas. Na Coupe de France, o time foi eliminado pelo modesto Arras, da quarta divisão: 2 a 0. Na Coupe de la Ligue, eliminou o Brest nos pênaltis (5 a 4, após empate em 1 a 1 no tempo normal, placar que persistiu na prorrogação) e sucumbiu diante do Créteil (2 a 1). Nada que apague a grande temporada no campeonato nacional. Agora, o clube trilhará caminhos jamais percorridos, e os torcedores mal podem esperar pela temporada que está por vir - ainda por cima, haverá dérbis com o SC Bastia.