Conforme cita um pequeno trecho de um dos vários cantos da torcida do Cruzeiro, “a história não mente e jamais vai mudar”. Tão real e intocável como este verso é a carreira de Roberto Monteiro. Para os cruzeirenses, Roberto Batata. Há exatos 40 anos, o ponta-direita falecia de forma prematura, aos 26 anos, após um acidente automobilístico.
Roberto Monteiro nasceu em Belo Horizonte, na Santa Casa, em 24 de julho de 1949. O garoto era o mais novo dos sete filhos do casal Geraldo e Judite. Em entrevista à Revista do Cruzeiro, Elge Monteiro, irmã de Roberto, diz que o apelido “batata” veio do ex-técnico João Crispim, pela forma física do jogador. Outros dizem que seria sua preferência em comer batatas fritas.
Roberto começou no futebol muito cedo. Passou pelo futsal do América e também jogou pelo time Banco Real (antigo Banco da Lavoura), onde se destacou em campeonatos amadores. Em 1968, o ponta-direita chegou às categorias de base do Cruzeiro onde ganhou o Campeonato Mineiro Juvenil.
O volante Piazza, que jogou no Cruzeiro nas duas formações históricas do clube, na geração de Tostão e Natal, e na seguinte, com Joãozinho e Palhinha, relatou à VAVEL Brasil o que viu em Batata, quando o mesmo estava próximo de chegar aos profissionais.
“Eu vi o Roberto nas categorias de base que era comandada pelo Crispim, e quando ele ascendeu aos profissionais, disse que ele era jogador de Seleção Brasileira. Ele executava perfeitamente o que chamamos de “facão”, sempre saindo da ponta para o meio. Ele tinha um biótipo espetacular, boa altura, passadas largas e uma ótima impulsão”, declarou.
A presença de Roberto entre os profissionais foi adiada após o empréstimo do jogador para o Atlético de Três Corações. Palhinha, jogador que chegou aos profissionais do Cruzeiro na mesma época que Roberto Batata, contou como aconteceram as negociações.
“O time profissional do Cruzeiro era muito bom, tinha Natal, Tostão, Dirceu Lopes, Evaldo, entre outras feras. E os juniores também tinha muita qualidade. O Cruzeiro emprestou quase todos os jogadores para o Atlético de Três Corações. Eu ia ser emprestado em 1970, mas acabei ficando”, explicou à VAVEL Brasil.
Após boa passagem pelo Atlético de Três Corações, Roberto voltou mais maduro ao Cruzeiro. O jogador estreou no time celeste em um amistoso contra o Peñarol-URU, no dia 20 de janeiro de 1971. Na ocasião, o Cruzeiro perdeu por 1 a 0 e teve seus jogadores expulsos de campo, inclusve Batata, por reclamar do gol uruguaio.
Com a saída de Natal para o Corinthians, Roberto Batata assumiu a condição de titular e não decepcionou. Foi cativando a vaga absoluta na posição, ganhando a confiança do torcedor e sendo um dos protagonistas de uma das gerações mais promissoras do Cruzeiro e do futebol brasileiro. Foi tetracampeão mineiro entre 1972 e 1975, e vice-campeão brasileiro em 1974 e 1975, perdendo para Vasco e Internacional.
Esbanjando qualidade e no auge de sua forma técnica e física, resultou em uma convocação do técnico Osvaldo Brandão para a Seleção Brasileira. Na ocasião, o selecionado canarinho disputaria a Copa América de 1975, com todos os jogos locais acontecendo no Mineirão. Vários nomes participaram como Piazza, Palhinha e o jovem Reinaldo, com 18 anos. O Brasil ficou com o vice-campeonato.
Taça Libertadores de 1976: o último ato de Roberto Batata
Roberto Batata seguia como um dos principais jogadores do Cruzeiro em 1976. A disputa da Libertadores daquele ano era um ponto chave para uma geração que ainda não havia conquistado um título de expressão.
Batata disputou a primeira fase e metade da segunda. Em 12 de maio, o Cruzeiro fez uma de suas melhores partidas naquela competição. Goleou o Alianza Lima, no Peru, por 4 a 0. Roberto marcou seus últimos dois gols com a camisa celeste. Ao retornar para Belo Horizonte, Piazza relatou o que aconteceu naquela viagem de volta.
“Todo elenco estava muito cansado. Chegamos mais cedo em Congonhas e tivemos que esperar o avião para Belo Horizonte até descer na Pampulha. O Roberto Batata foi alertado por mim, pelo Furletti [Carmine, diretor do clube] e outros jogadores para que ele não viajasse. Ninguém tinha dormido bem, todos estavam exaustos, mas a saudade que ele tinha da esposa e do filho falou mais alto”, disse.
Os conselhos dos jogadores não fizeram com que Roberto mudasse de ideia. O jogador pegou seu carro, um Chevette, e entrou a rodovia Fernão Dias. Batata seguia em direção à cidade de Três Corações, onde encontraria a mulher, Denise, e o filho, Leonardo. No entanto, um acidente interrompeu a carreira do ponta-direita, entre os quilômetros 182 e 183, altura da cidade de Santo Antônio do Amparo. Palhinha declarou o que aconteceu quando soube da notícia inesperada.
“Estávamos todos descansando em casa, e fiquei sabendo por volta de três, quatro horas da tarde. O Carmine Furletti ligou contando do acidente. Sabe quando você fica com uma coisa na cabeça e não sai? Eu falei várias vezes: 'Não vai, Batata. Não vai. Descansa que no dia seguinte tem treino e concentração'. Ele disse que ia buscar a família”, contou.
O velório de Roberto Batata aconteceu no dia 14 de maio, na sede social do Cruzeiro, com a presença dos jogadores da Raposa e outros companheiros. O atleta foi enterrado no Cemitério do Bonfim, em Belo Horizonte. A Federação Mineira de Futebol suspendeu o Campeonato Mineiro em sinal de luto pela morte do ponta-direita.
No dia 20 de maio, Cruzeiro e Alianza Lima voltaram a jogar pela Libertadores. No jogo, flores foram colocadas na ponta direita do campo do Mineirão, além de estender a camisa 7, que era de Roberto Batata. O time celeste fez 7 a 1, com quatro gols de Jairzinho e três de Palhinha.
"Contra o Alianza Lima, que foi a partida seguinte à morte do Roberto Batata, jogamos chorando. Quando fizemos 4 a 1, pensamos todos em fazer sete, para homenagear o Batata. A cada gol, comemorávamos com alegria e tristeza, tudo ao mesmo tempo", revelou Piazza.
O Cruzeiro seguiu a caminhada na Libertadores e conquistou o título ao derrotar o River Plate-ARG, por 3 a 2, no Chile. Piazza batiza com carinho a inédita taça.
“Se a gente pudesse colocar um nome naquela Libertadores que conquistamos, seria Roberto Batata. Porque ele jogou demais e depois da morte dele, o Batata foi a força maior que nos conduziu ao título baseado na tristeza e na dor pela perda do amigo”, contou.
Roberto Batata: uma pessoa ligada à família
Em entrevista à VAVEL Brasil, Sergio Murilo Detalond, sobrinho, e que o representa em homenagens feita ao Roberto Batata, conta como era o jogador na vida familiar.
“Minha mãe era irmã do Batata e eu era o sobrinho mais velho. Por isso acompanhei bem a carreira dele, pois era adolescente na época e jogava na base do Cruzeiro. Sempre nas folgas ele estava em casa. Inclusive com outros jogadores, como Nelinho, por exemplo, que por serem de outras cidades, faziam a casa do meu avô Geraldo, um 'ponto de encontro'". Sergio ainda acrescenta: “Morávamos no bairro Funcionários, onde hoje é o supermercado Extra e eram mais de dez casas da mesma família. Por isso esses jogadores gostavam de ficar por lá, pois virou uma referência para eles de 'família'. Após o casamento dele, em 1973, ele se mudou para o bairro Sion”.
Sergio ainda conta que viajava com Roberto para Três Corações frequentemente. “Quando o Cruzeiro viajava, a esposa dele ia para Três Corações, cidade da família dela. Na volta, quando ele ia buscá-la, eu ou um de meus primos o acompanhava na viagem. No dia do acidente, nenhum de nós pode ir e ele estava sozinho no carro”.
Sergio encerra agradecendo o carinho da torcida celeste com Roberto Batata. “Como ele faleceu aos 26 anos, sua carreira no profissional foi muito curta, mas o suficiente para mostrar a grande habilidade que possuía – aliás, aquele time todo do Cruzeiro era assim – e ao mesmo tempo um futebol solidário e de entrega. Por isso, talvez, tenha sido chamado para a Seleção Brasileira e também era sempre saudado pela torcida em reconhecimento”.
Roberto Batata jogou no Cruzeiro entre 1971 e 1976, marcou 110 gols em 280 jogos. Informações do Almanaque do Cruzeiro, de Henrique Ribeiro.