Muitos contextos nos levam até a presente pauta. Contextos não somente de dentro do Grêmio ou da lembrança da marcante torcida Coligay, que frequentou o estádio Olímpico Monumental em Porto Alegre entre os anos de 1977 e 1983. Mas contextos sociais, do país e da comunidade da qual fazemos parte atualmente. Todas essas histórias motivam manifestações e divulgações das ações feitas, como a proposta da Tribuna 77 em homenagear a torcida Coligay.

A Coligay foi uma torcida criada em 1977, precisamente em 10 de abril daquele ano. Portanto, foi seu 40º aniversário durante a semana que se passou. Um valioso texto do El Pais Brasil colocou em evidência a lembrança da torcida em proporções nacionais e até internacionais, como ela merece. A Coligay surgiu por frequentadores de uma casa noturna de Porto Alegre, chamada Coliseu. É da nomenclatura da boate que surge o nome da organização de torcedores, pioneira pelo país e pelo mundo do futebol.

Volmar Santos, hoje com 68 anos, era o dono da casa noturna Coliseu. Ele teve a ideia da organização da Coligay no estádio, algo que juntasse a luta pelo reconhecimento, contra o preconceito e, ao mesmo tempo, com o intuito de animar as arquibancadas. O próprio Volmar considerava que a torcida gremista precisava de mais animação e apoio ao time. Foi o que fizeram, sempre trajados com as cores do Grêmio e embalados por coreografias e cantos de incentivo enquanto durou a participação da Coligay no Olímpico.

Coligay no estádio Olímpico (Divulgação / Libretos)

É preciso entender o contexto histórico. O Brasil vivia tempos muito repressores no período da ditadura militar (1964-1985). Manifestações públicas de pessoas declaradas LGBT e seus poucos apoiadores costumavam ser rechaçadas com violência e até mesmo com prisões. Obviamente, a aceitação da presença da Coligay não era algo simples para sociedade, para o clube do Grêmio, para os demais torcedores da instituição e para os torcedores adversários. A coragem da Coligay e de seus integrantes, que chegaram a ser 60, deve ser exaltada. Não fugiram da luta a que se propuseram, frequentando das festas ao estádio, incentivando ao Grêmio e participando de um período especial de conquistas do clube, de campeonatos estaduais ao título brasileiro e da Libertadores.

Esse período do clube é ressaltado por uma nova ala de gremistas, a Tribuna 77, um grupo de torcedores que se reúne na tribuna superior norte da Arena. Eles adotaram o número 77 como especial pelas mudanças passadas no clube à época. Em 1977, o Grêmio interrompeu uma sequência de títulos gaúchos do rival Internacional. No mesmo ano, como mencionado no início do texto, a Coligay passou a se organizar para frequentar o estádio Olímpico. Era uma nova era de conquistas para o Grêmio e de luta por direitos.

A Tribuna 77 relembrou o aniversário da Coligay por meio de postagens nas redes sociais e do maior gesto, a leva de uma faixa ao setor superior norte da Arena, em manifestação ocorrida na partida contra o Deportes Iquique, pela fase de grupos da Copa Libertadores da América. É justo que os créditos dessa - ainda - corajosa ação sejam dados. Não foi uma ação do clube ou da torcida do Grêmio em geral. Apesar disso, a manifestação proposta pela Tribuna 77 teve maior aceitação e apoio do que críticas negativas. Os próprios componentes da Tribuna afirmam que nem darão eco aos que discordam.

"Foi mágico. A ancestralidade estava presente. Fizemos o nosso mesmo ritual de sempre. Pra nós é uma ação normal, reviver a história do clube, falar das coisas do mundo, a arquibancada como espaço democrático. Uma vez em um estádio, uma faixa já pertence ao povo, a mensagem voa, livre. Ressignificar este tema nos 40 anos de 1977 me parece fundamental para o clube. Hélio Dourado deixou um legado imenso, e isso deve servir de ensinamento e aprendizado. E na avalanche de intolerância dos dias de hoje, mais." Foi o comentário em nome da torcida Tribuna 77 para VAVEL Brasil.

"A torcida do Grêmio tem exemplos fantásticos ao longo da história. A Coligay era uma torcida abnegada, que participou ativamente na construção da parte superior do Estádio Olímpico Monumental, entre outras ações fundamentais na caminhada rumo ao topo do mundo. A homenagem e a referência na memória de todos os Gremistas é mais do que justa, é uma honra."

Para o Grêmio e para os gremistas, a ação foi importante para novos enfoques na Arena. O estádio gremista presenciou injúrias raciais contra o goleiro Aranha, então arqueiro do Santos, em 2014. O episódio teve grande repercussão negativa e muitos generalizaram a todos os torcedores do Grêmio pelo caso de racismo.

A mensagem em homenagem e apoio aos pioneiros da Coligay é disseminar a necessidade de combater essas formas de preconceito, de gremista para gremista, de cidadão para cidadão. Não permitir tais preconceitos nos ambientes frequentados.

O jornalista Léo Gerchmann foi um dos apoiadores da causa. Ele é autor de dois livros que abordam a temática, o "Somos azuis, pretos e brancos" e o "Coligay - Tricolor e de todas as cores", leituras essenciais como exemplo de cidadania e resgates à memória do Grêmio.

Sobre a Tribuna 77, a manifestação de apoio não foi a primeira e nem a última. O grupo de gremistas segue a se reunir na tribuna superior norte da Arena, exaltando cultura, lembranças da história gremista e outros temas de debate na sociedade. Recentemente, a faixa "lugar de mulher é no estádio" também se faz presente em jogos. É com esse espírito de luta e consciência que grupos de gremistas buscam manter a chama acesa, as memórias vivas, os erros a se combater e os grandes gestos e exemplos para se repetir.