Em entrevista exclusiva à VAVEL Brasil, o pesquisador e escritor Sérgio Frias colocou totalmente o fator política de escanteio e resolveu falar sobre seu livro "Eurico Miranda: todos contra ele", lançado no ano de 2012.

Quando se fala sobre o Vasco, é automático lembrarmos de Eurico Miranda, uma figura polêmica que por esse motivo não era vista com bons olhos por muitos da imprensa e da torcida também, considerado pulso firme em assuntos relacionados ao clube. Sérgio Frias obteve autorização para escrever a primeira biografia desse personagem marcante para o futebol e tido como um dos maiores dirigentes da história do esporte.

O pesquisador contou nas 540 páginas do livro de forma original mesclando a história do Vasco com a de Eurico, contando pelo olhar de um vascaíno apaixonado os altos e baixos, além de todas as polêmicas envolvendo o então mandatário, destacando sempre o amor incondicional do mesmo pelo Cruzmaltino.

"Como eu acompanhei o mais perto que pude sua trajetória, desde o momento em que passou a ter penetração na mídia, vi imediatamente, mesmo enquanto criança que eu era, algo completamente diferente daquilo que surgia para falar em termos de Vasco, representando-o. Por diversas vezes o vi tomar medidas que o prejudicariam pessoalmente, o antipatizariam publicamente, olhando ganhos primordiais para o Vasco nisso. O maior emblema de tudo isso foi peitar a grade global em 2000, impedindo que o Vasco atuasse em mais jogos encavalados, após já tê-lo feito, em partidas de mata-mata, oito vezes, no espaço de 20 dias (entre 24/11/2000 a 14/12/2000)", disse.

Aquela camisa vascaína com o logo do SBT

Eurico e Romário comemorando o título da Copa João Havelange (Foto: Reprodução/Vasco)
Eurico e Romário comemorando o título da Copa João Havelange (Foto: Reprodução/Vasco)

O entrevistado contou sobre um fato interessante que acabou gerando muita polêmica naquela época. No jogo da final da Copa João Havelange de 2000, entre Vasco e São Caetano, que aconteceu no dia 18 de Janeiro de 2001, no estádio do Maracanã, a Globo tinha os direitos de transmissão como acontece nos dias de hoje.

Os jogadores da equipe carioca entre eles tínhamos grandes nomes como Romário, Juninho Paulista, Euller, Juninho Pernambucano, entre outros, entraram em campo vestindo uma camisa com a estampa do SBT. Muitos alegavam que isso foi uma espécie de vingança do mandatário vascaíno, em relação a extensa cobertura da queda do alambrado em São Januário, que deixou 168 torcedores feridos. E segundo Sérgio Frias, Eurico acabou sofrendo indiretamente um ataque por parte da emissora carioca por conta dessa atitude.

"Posteriormente, em virtude de ter dado a resposta ao massacre sofrido pelo Vasco, desde a queda do alambrado até o dia da decisão, com a camisa do SBT posta no uniforme dos atletas que atuariam contra o São Caetano, sofreu ele próprio uma perseguição da Rede Globo, que manifestou publicamente, através de um de seus executivos, para o jornal 'Meio e Mensagem', em fevereiro de 2001, que o Vasco sofreria um torniquete financeiro da emissora, uma vez que ela antecipava cotas de TV a todos, mas não mais o faria com relação ao Vasco. O objetivo, dito na declaração, era o de enfraquecer o clube e fazer, com isso, que a torcida vascaína se revoltasse contra seu dirigente."

Romário após vitória sobre o São Caetano (Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal Romário)
Romário após vitória sobre o São Caetano (Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal Romário)

Frias ainda completou: "O clube, de fato, ficaria 18 meses sem receber um centavo da emissora, ou seja, metade da primeira gestão de Eurico Miranda, gestão essa na qual o Vasco foi Campeão Carioca no futebol profissional (ganhou quatro taças), igualou recorde de vitórias consecutivas na Taça Libertadores, jamais batido por qualquer outro clube, foi Campeão Brasileiro e Carioca de Basquete, tetra e penta no Remo, foi campeão na base, aplicou a maior goleada da história dos clássicos contra Botafogo e São Paulo, viu Botafogo e Palmeiras caírem de divisão, foi visivelmente prejudicado por arbitragens em várias competições de escala estadual, nacional e internacional, aumentou seu patrimônio físico e manteve o respeito perante seus adversários."

Um brigador em nome do Vasco

Foto: Reprodução/Vasco
Foto: Reprodução/Vasco

Sérgio Frias fez questão de apresentar um Eurico Miranda desconhecido pelo grande público e que ia na contra-mão de tudo que era divulgado sobre o dirigente. A ideia principal era mostrar que por trás daquela personalidade forte existia um fanático pelo Vasco que buscava sempre o melhor para clube.

"Que alguém que lute por uma causa como Eurico Miranda lutou deve ter reconhecimento pelos adeptos da causa e não o contrário, diminuindo os feitos por despeito, inveja ou antipatia trazida pelos de fora do Vasco até chegar aos de dentro, como no caso do Vasco chegou."

Quem já teve a oportunidade de ler a biografia do ex-presidente, sabe que é uma tarefa bem complicada escolher uma passagem específica para citar como destaque, já que todos os fatos são contados com muitos detalhes.

Perguntado sobre a repercussão do lançamento do livro na imprensa e entre os torcedores, o autor revela que na época a biografia não teve grande veiculação na mídia, mas que não tem como ludibriar um torcedor diante de uma história tão completa contada detalhadamente.

"O livro pouco repercutiu na imprensa, que fez força para praticamente ignorá-lo, até porque pô-lo em discussão causaria constrangimentos a discursos repetidos e muito distantes da realidade sobre o personagem. Não há como manipular o torcedor vascaíno a respeito do citado personagem, mostrando seus feitos, comparando com outros e rememorando, mostrando, evidenciando contra o que e quem teve que brigar em nome do Vasco, pelo respeito ao clube.

Tudo isso com um resultado muito positivo, vide títulos em relação aos rivais, ineditismo de vários, confrontos diretos contra os principais rivais, crescimento patrimonial, ações sociais, diminuição da dívida global do Vasco e resistência diante de tantos inimigos ou oponentes criados pelo fato de ter exigido aos demais que o clube, independentemente de uma eventual performance esportiva, estivesse sempre num primeiro plano (vide divisão das cotas de TV firmadas ao longo dos anos até sua saída do clube em 2008) e com um líder nato para opinar e influenciar nos caminhos do futebol carioca e brasileiro.

Afinal, de fato, foi ele contra e brigou contra os principais males do nosso futebol nesse século, em posição diametralmente oposta a formadores de opinião, que lutaram, seja por visão míope ou outro interesse qualquer, pela concreta autofagia do futebol brasileiro, proporcionada por leis e encaminhamentos perversos contra ele próprio.

O livro é um catalisador de pontos marcantes do clube e de Eurico Miranda dentro dele. A história do Vasco, ali resumida, não possui um ponto marcante, mas muitos que tornam o clube marcante e a participação emblemática de Eurico Miranda no Vasco segue a mesma linha. O que mais repercutiu no livro foi a importância de Eurico Miranda na história do clube, uma vez inserindo-se nela para modificá-la, como o fez."

Legado de Eurico

Foto: Reprodução/Vasco
Foto: Reprodução/Vasco

Em mais de 40 anos em prol do Vasco, Eurico Miranda deixou várias histórias com conquistas e derrotas. Questionado sobre quais os ensinamentos deixados pelo mandatário, Sérgio não pestanejou e ressaltou a necessidade de se reconhecer e valorizar aqueles que são verdadeiros na luta pelo clube.

"Que o Vasco é do tamanho que sua torcida quiser que seja, desde que enfrente quem tenha de enfrentar e saiba reconhecer quem a defende, por extensão, ao defender o clube.

A história do Vasco precisa ser contada da maneira correta, por vascaínos que a pesquisem, a entendam e a descrevam de forma fidedigna, dando crédito e mérito a quem os tem, daí o livro, que é a expressão da verdade dos fatos e dessa história, atravessada por quem a fez se modificar totalmente, após um quarto de século (1960 a 1985) com o Vasco figurando em número de títulos, desde Campeonatos Cariocas, da seguinte forma no Rio de Janeiro: Flamengo (14), Fluminense (13), Botafogo (8), Vasco (5)."

Em fevereiro, o benemérito cruzmaltino criou um perfil no Instagram, onde posta diariamente um capítulo da história vencedora do Vasco. Perguntado como a ideia, ele explicou que a intenção é mostrar a grandiosidade do Vasco e comemorou o resultado positivo do projeto.

"A ideia surgiu, a partir da lógica correta de quão grande o Vasco é, independentemente da época, de conquistas ou não. Isso se expressa revisitando o clube e seus triunfos ao longo de toda a sua história. A repetição de mais do mesmo dos momentos tidos como emblemáticos ou mais divulgados, mais lembrados, por qualquer razão, resume a história do clube a eles, principalmente para o torcedor mais jovem, que já encontrou o Vasco com 90, 100 anos de existência quando começou a acompanha-lo. A história do Vasco no futebol vai muito além daquilo que é repetido em larga escala.

"O resultado vem sendo positivo sim e convido os vascaínos a acessarem @sergioedufrias para verem diariamente um grande momento do Vasco naquela data (em ano diferente), que tenha sido por razões múltiplas marcantes para o clube, sua torcida ou mesmo para um de seus operários da bola. Além disso, um gol raro, ou golaço, ou gol emblemático (ou tudo junto no mesmo gol) é tirado de meu arquivo pessoal em vídeo e apresentado ao público vascaíno, bem como aos amantes do bom futebol, diariamente", falou o biógrafo.

Encerrando a entrevista, Sérgio Frias deu uma notícia animadora para os torcedores e apaixonados por futebol que curtem uma leitura interessante que agrega conhecimento. A respectiva biografia, em breve, poderá ter uma segunda edição com novos relatos. 

"Finalmente, ainda sobre o livro, há a ideia de um 'post scriptum' numa segunda edição, afinal ele termina em 2012 e depois disso muito ocorreu até o falecimento de Eurico Miranda em 2019."