«A mudança foi possível porque temos um treinador corajoso». A frase do Presidente do Benfica sobre o novo rumo na gestão da equipa, poderia significar a vangloria da liderança numa época de alterações estruturais no seu elenco. Mas o facto de ter sido proferida em Outubro passado, vem impulsionar a sua mensagem, num golpe de confiança na escolha feita para a direcção técnica, na figura de Rui Vitória, ainda antes de serem apresentados os resultados de um eventual sucesso. E é disso que trata este artigo. Da íntima confiança que o presidente encarnado tem depositado na sua equipa técnica, no passado recente e como acompanhamento da consolidação da sua liderança pessoal no seio do clube. Será esta a fórmula do Benfica mais competitivo a que temos vindo a assistir nos últimos anos? Como a nuance sobre um passado mais sombrio, de mudanças constantes de treinadores e a sua consequente instabilidade?

O fim de uma relação pode ser duro. Como tendeu a ser o fim da relação que unia Luís Filipe Vieira e Jorge Jesus, enquanto dupla de sucesso na Luz. O treinador chegou pela mão do Presidente, que nunca a largou, mesmo nas horas mais sombrias. Na derrota no Dragão que ofereceu um campeonato a Norte; em Amesterdão, na primeira final europeia da campanha de ambos; ou em Turim, na segunda final consecutiva que não resultou em festejos, Jesus nunca deixou de ter o apoio da sua direcção. A mesma que esteve ao seu lado, em aclamação, na celebração dos títulos conquistados, oferendo-lhe os louros. E não é numa fase positiva que se espera que uma relação destas termine. Mas esta terminou. E a mal. Quando as vontades de ambos não se coadunaram e resultaram na ruptura.

Vieira e Jesus foram uma dupla de sucesso na Luz (Foto: pantominocracia)
Vieira e Jesus foram uma dupla de sucesso na Luz (Foto: pantominocracia)

Pode o término de uma relação fazer pairar a incerteza no futuro, firmando substituições menos acertadas.  Ou pode, neste caso concreto, significar a transferência de confiança, de um treinador para um novo, trazendo simultaneamente a mudança prometida em folhetos de campanha. E a mudança do banco passa a significar, no final, a instauração de um novo paradigma. «Agora estamos no tempo de apostar nos talentos gerados no Seixal num modelo que equilibra a competitividade desportiva com a redução do nosso endividamento», elucidou Vieira em momento de início de época. E voltou a reitera-lo em Dezembro: «Menos compras. Mais jovens. É esta a visão que tenho para o futuro do Benfica», numa altura em que o clube ainda não crescia dentro da sua nova realidade.

Estavam mudados os modelos. E o presidente acreditava tanto neste, como no anterior, da era Jesus. Chega a ser contraditória a crença cega em modelos separados por meios de operar tão distintos. Mas foi a confiança o elo de administrar. O apoio público incondicional a Jorge Jesus e, depois, a Rui Vitória é irrefutável. Consideremo-lo como o «Modus Operandi» da campanha vieirista. Que usou a seu favor quando, no final do ano e depois de um início de época desastroso, se aumentavam os rumores especulativos sobre a substituição do banco da Luz. «É esse equilíbrio que quero pedir a todos. Sermos exigentes, mas ao mesmo tempo perceber que nenhuma mudança de faz de forma instantânea e sem alguns custos», disse como um verdeiro Pastor.

Rui Vitória na sua apresentação disse que "vou dar a minha vida pelo SL Benfica" (Foto; Mais Futebol)
Rui Vitória na sua apresentação disse que "vou dar a minha vida pelo SL Benfica" (Foto; Mais Futebol)

Com a aposta em Rui Vitória, Luís Filipe Vieira correu um risco maior. Menos calculado, em virtude das dúvidas que se levantavam sobre o estofo e capacidade do novo técnico orientar a nova equipa, que se começou a renovar com a entrada dos recursos formados no clube. O mais fraco investimento no plantel dos últimos anos, com a desconfiança natural da massa associativa, fizeram de Vitória um verdadeiro investimento de risco, que, para gáudio dos intervenientes, começa a mostrar resultados, com a liderança assegurada e a renovação do título a depender de si. «O tempo – e o nosso treinador – provaram que sim. Que é possível sermos competitivos olhando para a nossa formação, que é possível ganhar combinando a experiência dos mais velhos e a irreverência dos mais novos, que é possível mudar contrariando o receio e a desconfiança de muitos», conferiu na passada semana.

A sintonia aparente entre treinador e presidente podem ser a coesão que o Benfica buscava nas últimas décadas. E pode ser ainda a eventual justificação de novas conquistas.

«Dentro do Benfica temos o direito a divergir, mas os nossos adversários estão lá fora», Luís Filipe Vieira.