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Barcelona x Real Madrid: A ideologia também faz parte do «El Clásico»

As diferenças entre o Barcelona e Real Madrid acentuam-se fora das quatro linhas com os catalães a serem um simbolo da independência catalã e os madrilistas a simbolizarem a Espanha unida.

Barcelona x Real Madrid: A ideologia também faz parte do «El Clásico»
paulopereira79
Por Paulo Pereira

Uma das primeiras questões levantadas neste duelo Barcelona x Real Madrid é o facto de o Real ter sido fundado em 1902 pelos irmãos Juan Padrós e Carlos Padrós, catalães de nascença. Outra será a questão do ditador Francisco Franco, que dirigiu a Espanha de 1938 a 73, a ditadura continuou até 1976 mas com outras pessoas à frente dos destinos do país, ter sido adepto do Real Madrid como admite o seu neto no documentário «El Madrid real. La llegenda negra de la glòria blanca» do jornalista Carles Torras, ou da amizade do ditador com Raimundo Saporta, destacado director do Real.

Sem esquecer a transferência de Di Stéfano que ia jogar no Barça, onde chegou a jogar cinco jogos de carácter particular, mas Franco resolveu desviar o jogador para Madrid. Até ao ano de 1953 a Liga tinha 22 edições e sete vencedores diferentes. O Barcelona era o maior vencedor, com seis títulos, seguido pelo Athletic Bilbao com cinco. O Atlético de Madrid tinha quatro, o Real Madrid e o Valência tinham dois títulos cada, e os sevilhanos Real Bétis e Sevilla com apenas um cada. Mas a partir desse ano a história do Real Madrid começou a mudar. De 1953 até o fim da ditadura Franquista (1976) a Liga foi disputada 23 vezes e o Real Madrid, nesse período, ganhou a Liga 15 vezes enquanto o Barcelona e o Atlético de Madrid venceram três vezes e o Athletic Bilbao e o Valencia apenas uma vez.

Em 1943 na meia final da Taça Generalíssimo (actualmente Taça do Rei), o Barcelona venceu 3-0 na primeira mão, mas em Madrid foram obrigados por soldados ao serviço de Franco a perderem. O resultado foi de 11-1 em partida que não é reconhecida pela FIFA e é conhecido pelo famigerado «escândalo de Chamartín».

O ditador Francisco Franco viu que o futebol seria uma óptima maneira de promover o poderio do seu governo, e com isso, para combater os anti-fascistas que se aliavam com alguns clubes como o Barcelona e o Athletic. Com essa intenção, Franco ajudou o Real Madrid a montar uma grande equipa com Di Stéfano, Puskas, Kopa, entre outros craques, além de ter ajudado o clube a erguer o estádio Santiago Bernabéu. Graças à cooperação estreita do regime governamental, o Real Madrid tornou-se uma grande empresa famosa no mundo todo.

De 1976 até ao fim da década de 80, o Real Madrid ainda reflectia a profícua e valorosa campanha adquirida na ditadura, vencendo 8 das 14 Ligas com uma equipa muito forte liderada pelo goleador mexicano Hugo Sánchez. Na primeira metade da década de 1990, o Barcelona que havia cicatrizado as marcas da ditadura voltou ao topo ofuscando o Real Madrid. O clube catalão liderado pelo mítico holandês Johan Cruyff dominou o cenário espanhol, vencendo quatro Ligas seguidas e a inédita Taça dos Campeões em 1992.

Já na segunda metade da década, o Real Madrid reergueu-se sob o comando do presidente Lorenzo Sanz, vencendo duas Champions League (1998 e 2000). Em 2000, Florentino Pérez venceu as eleições e tornou-se presidente do clube. Florentino foi responsável por montar a armada dos «Galácticos» com estrelas mundiais como Zidane, Figo, Owen, Beckham, Ronaldo, Morientes, entre outros craques e venceu a Champions League de 2002. Depois de apenas dois títulos em quatro anos, após a péssima campanha na Liga graças ao fracasso de Vanderley Luxemburgo e a eliminação para o Arsenal nos oitavos-de-final da Champions League 2005/06, Florentino demitiu-se alegando que o clube precisava de uma nova direção. Ramón Calderón assumiu o comando do clube madrileno, mas não obteve sucesso. Fracassou com poucas contratações e títulos escassos.

Em 2009, Florentino Pérez candidatou-se à presidência do clube com o mesmo projecto do primeiro mandato de montar a formação dos «Galáticos». Foi eleito por ser o único candidato capaz de fornecer alguma garantia ao clube, e no dia 1 de Junho de 2009 voltou ao cargo. Com a ascensão do Barcelona naquele ano (ganhando o triplete), Florentino encontrou-se no dever gastar verbas no reforço da equipa «merengue» com Benzema (35 milhões), Xabi Alonso (40), Kaká (65) e Cristiano Ronaldo (94), financiados pelo Bankia, banco controlado em 45% pelo governo espanhol. Anos mais tarde também contratou jogadores como Di María (25), Fábio Coentrão (30), Luka Modric (30), Isco (27), Illarramendi (39) e Bale (91), este último também financiado pela Bankia.

Segundo o jornal britânico The Independent, o Real Madrid recebe ajudas da Câmara da cidade, que é ilegal de acordo com os regulamentos do UEFA Financial Fair Play que incrimina qualquer auxílio estatal no âmbito do futebol profissional. O acordo ilegal entre o Real Madrid e a Câmara Municipal de Madrid implica, naturalmente, que o clube receberá, alegadamente, regalias de terrenos ao redor do estádio Santiago Bernabéu para obras de reforma do estádio e a construção de um novo centro comercial e um complexo hoteleiro.

Por seu lado, o Barcelona foi fundado em 1899 por um grupo de doze pessoas entre eles, Hans Gamper, um ex-futebolista suiço. Foi sempre um simbolo da independência catalã e no último referendo de independência não oficializado pelo governo espanhol o clube emitiu uma nota oficial em que anunciou o apoio ao Pacto Nacional pelo Direito de Decidir, uma instituição criada para impulsionar o referendo. A 14 de junho de 1925, um facto político teria pela primeira vez importância no clube, numa reacção contra a ditadura de Primo de Rivera, os adeptos vaiaram o hino da Espanha.

Como represália, o clube foi fechado durante um período de seis meses, enquanto Gamper, presidente do clube na altura, foi mesmo forçado a renunciar à presidência. Após a Guerra Civil Espanhola, o vitorioso General Franco proibiu oficialmente manifestações culturais que não as castelhanas no país, proibição que se estendia ao uso da língua catalã. Estas medidas fizeram com que houvesse alterações no Barcelona: do nome, para Club de Fútbol Barcelona; e no símbolo, em que quatro faixas vermelhas na parte superior direita, alusivas à bandeira da Catalunha, foram diminuídas para duas, para representar a bandeira da Espanha.

Por consequência, o Campeonato Catalão, após a edição de 1940, foi extinto, com o Barcelona terminando como o seu maior vencedor, somando 23 títulos, o dobro do rival Espanhol. Durante a era franquista, um dos poucos lugares em que se podia falar catalão era o estádio do Barça. Daí viria a associação cada vez maior do orgulho catalão com o Barcelona, ao passo que o rival Espanhol passaria a ser identificado como um aliado do regime de Franco.